MAIORIDADE PENAL EM FOCO

A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados (CCJ) aprovou, nessa semana, a tramitação da proposta de emenda constitucional que pretende reduzir para 16 anos a maioridade penal.

Trata-se, na verdade, do primeiro passo de um longo processo legislativo. Quer dizer, que pode ou não ser longo, dependendo dos interesses políticos dominantes daqui para a frente. A CCJ não aprova ou rejeita o texto. Ela apenas avalia se, em tese, a proposta é ou não constitucional para que prossiga seu caminho até a votação. E serão quatro votações: duas na Câmara e duas no Senado, tendo que ser aprovada por 60% dos parlamentares em cada uma das quatro passagens.

Mesmo assim, é um fato marcante, por duas razões.

A primeira é jurídica. Estou com aqueles que entendem que, independentemente da razão social (que virá abaixo), o tema é inconstitucional. A maioridade penal aos 18 anos, uma vez colocada na Constituição Federal em 1988, tem status de cláusula pétrea – portanto, não pode ser suprimida ou reduzida da Carta Republicana. Tal condição decorre de se constituir como um direito individual, nos termos do art. 60, § 4º, da Lei Maior:

Art. 64. (…)

§ 4º – Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: (…)

IV – os direitos e garantias individuais.

A CCJ certamente se alinhou com o grupo que defende que os “direitos e garantias individuais” são unicamente aqueles que estão listados no art. 5º da Carta Magna. Não. Direitos e garantias individuais são aqueles que se identificam com os direitos humanos de primeira geração, as garantias do cidadão contra o Estado – também chamadas de liberdades negativas, porque impõem um “não fazer” para o Estado: o cidadão tem o direito de não ser impedido de ir e vir, de não ser punido com a morte, de não ser tributado por fato não previsto em lei (art. 150, I, da CF), de não ser processado criminalmente antes dos 18 anos de idade.

Enfim, quanto a esse aspecto (controle da constitucionalidade da emenda constitucional), a decisão final é do STF, que certamente será provocado por grupos contrários à medida para se manifestar. Vamos esperar essa deliberação do Supremo. Mas é bom esperar sentado, porque vai demorar…

Há, inegavelmente, a preocupação social.

Pessoalmente, acho que, na sociedade de hoje, 16 anos é idade mais do que suficiente para atribuir a alguém a responsabilidade por um crime. As pessoas atualmente se desenvolvem, física e intelectualmente, muito mais rápido do que nas décadas passadas. Prova disso é que o Código Civil, lá em 2002, reduziu a maioridade de 21 para 18 anos, atualizando a disposição legal que vinha desde 1916.

A preocupação, contudo, vem do fato dessa emenda representar um grito de clamor da sociedade já antigo contra a violência urbana. Existe a crença de que os adolescentes criminosos escolhem esse caminho porque não são punidos. Ao mesmo tempo, assumem os crimes dos adultos para livrar-lhes da cadeia, já que não são punidos.

Dois problemas, mais uma vez.

Os adolescentes, na prática, são punidos. Dizer que a Fundação Casa (aqui no Estado de São Paulo) e suas congêneres espalhadas pelo país são “centros de ressocialização dos adolescentes”, pois representam uma “medida sócio-educativa” ao adolescente infrator, para afirmar que não existe pena para os jovens é discurso político barato. Os estabelecimentos de internação de adolescentes há muito tempo não se diferenciam em nada das penitenciárias, tanto no aspecto da segurança (grades, homens armados, muros altos etc.) quanto nos problemas de gestão (superlotação, rebeliões, falta de condições de higiene etc.). Talvez fosse mais efetivo e realista mexer no Estatuto da Criança e do Adolescente, aumentando, por exemplo, o tempo máximo de internação de 3 para 6 ou 8 anos; e/ou permitindo que a folha de antecedentes do adolescente seja considerada na idade adulta.

O outro problema é o de sempre: no nosso país, temos um ancestral hábito de tapar o sol com a peneira. Escolhemos sempre o caminho mais fácil, usamos os meios de comunicação para convencer a maior parte da população que esse caminho mais fácil é exatamente tudo o que precisamos para resolver todos os nossos problemas e, com esse novo apoio da população, aprovamos o projeto.

Reduzir a maioridade penal não vai adiantar nada no problema da segurança pública.

Mais de um estudo já divulgou que cerca de 1% dos crimes do  país são praticados por adolescentes. Já considerados aqueles que eles apenas assumem para livrar o comparsa maior de idade. Tenho certeza de que a “redução” de 1% na criminalidade não é o resultado que esperamos.

Haverá, também, o efeito prático: ora, se a partir de um certo momento aos 16 anos já pratica crime e vai para a cadeia, vamos colocar o jovem de 15 anos para assumir a “bronca”. Bom, então DEVEREMOS BAIXAR A IDADE PENAL PARA 14 ANOS! (já posso ouvir os gritos) E assim vai… Entenderam minha preocupação?

Ah, mas o “menino” de 16 anos matou uma vítima inocente! Deve ficar 30 anos preso e não 3! Ah, então toda a discussão gira em torno da vingança privada… Então tá…

 

Leia mais: https://www.conjur.com.br/2015-mar-31/camara-aprova-tramitacao-emenda-reduzir-maioridade-penal

https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2015/03/proposta-de-reducao-da-maioridade-penal-provoca-protestos-na-camara.html

https://www.camara.gov.br/internet/deputado/Frente_Parlamentar/53397.asp